domingo, 2 de janeiro de 2011

A JUVENTUDE CATÓLICA E OS SEUS CLAMORES Por Pedro Ravazzo


Quantas vezes nós não ouvimos as mais absurdas argumentações para endossar o erro, o abuso e a irreverência na Igreja? Entretanto, sem dúvida alguma, um dos raciocínios comumente utilizados é a dita “modernização” para aproximar a fé aos jovens. Deve ser frisado, antes de qualquer coisa, que se a nossa crença vem de Deus, reflete, então, a Sua imutabilidade e eternidade – e, sendo assim, pensar numa adaptação que não seja do trabalho pastoral não é apenas uma falácia, mas uma heresia. Ademais, os jovens não passam de falsos pretextos usados para justificar a megalomania e desobediência de muitos religiosos que, de maneira mesquinha, preferem seguir teologias próprias a serem fiéis à Igreja. A juventude, na realidade, não aprecia e nem muito menos compactua com tais imprecisões. Os jovens preferem a mais sincera ortodoxia e honesta piedade.
Quem nunca assistiu, ou ouviu falar, de “Missa dos jovens”? Essa nomenclatura é totalmente inapropriada, não só porque a Missa é apenas uma, porque apenas um foi o Sacrifício, mas também porque o rito da Liturgia não permite tal flexibilidade, a ponto de serem criadas novas rubricas e normas baseadas em impressões pessoais acerca da celebração. Entretanto, o problema é mais profundo do que um simples nome. As tais “Missa dos jovens” se distanciam, e muito, da reverência ao Sacrifício.
A Missa é renovação do Sacrifício do Calvário; “A Eucaristia é, portanto, um sacrifício porque representa (toma presente) o Sacrifício da Cruz, porque dele é memorial e porque aplica seus frutos”, “O sacrifício de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício.” S.S João Paulo II disse, na encíclica Ecclesia de Eucharistia: “A Missa torna presente o sacrifício da cruz; não é mais um, nem o multiplica.(16) O que se repete é a celebração memorial, a « exposição memorial » (memorialis demonstratio),(17) de modo que o único e definitivo sacrifício redentor de Cristo se actualiza incessantemente no tempo. Portanto, a natureza sacrificial do mistério eucarístico não pode ser entendida como algo isolado, independente da cruz ou com uma referência apenas indireta ao sacrifício do Calvário (n. 12, itálicos do original)” Ademais, lembremos que o Concílio de Trento  declarou solenemente que o Sacrifício da Missa era o centro da Liturgia católica, em oposição aos ensinamentos heréticos de Martinho Lutero que diziam que a Missa era apenas um banquete de realidade simbólica – heterodoxia esta que, atualmente, deixou de ser exclusividade protestante e passou a ser defendida até mesmo entre católicos.
Muitos alegam que a Ressurreição também é renovada, e esse seria o motivo do regozijo meramente humano – bem diferente da santa alegria espiritual. Entretanto, enquanto a Paixão é, de fato, atualizada e presente sacramentalmente, a Ressurreição não passa de um recordação sem nenhuma realidade substancial presente, tanto é assim que nós “Anunciamos” a morte do Senhor e “Proclamamos” a Sua Ressurreição. O que isso representa? A morte de Cristo é renovada misticamente, atualizada na Missa em comunhão com o Calvário, se faz presente plenamente. Já a Ressurreição não ultrapassa a barreira temporal, não é atualizada na Celebração e lembrada apenas enquanto evento que se deu no tempo. Assim, podemos concluir que – ou as pessoas desconhecem o caráter sacrificial da Liturgia e por isso são permissivos aos abusos e corrupção – ou então, em franca desobediência ao que sempre foi crido pela Igreja e pelo povo Deus, sancionam, através de imprecisões teológicas e heresias, a lastimosa transformação do correto espírito litúrgico.
A Missa é Calvário e como Calvário nos pede uma espiritualidade específica – ou será que alguém tocaria bateria, guitarra e baixo sob os pés de Cristo? Para algo ser digno da Missa deve excluir tudo de profano, não porque seja apenas um capricho da Igreja, mas porque a Liturgia, sendo um pedaço no Céu na terra, deve servir como uma prévia do esplendor da morada celeste. Entretanto, quando profanamos a Liturgia, deixando que seja mundanizada, impedimos não a realidade sobrenatural da Missa, que sempre há quando existem celebrações válidas, mas diminuímos os efeitos de santidade causados no povo de Deus.
Os defensores das tais Missas jovens alegam, também, que estas celebrações aproximam a juventude da Igreja. Tal argumento não pode prosperar. A uma, porque a Liturgia não é ferramenta catequética, os que assistem e comungam são aqueles que entendem o que é celebrado no altar. A duas, porque estamos prestando um desserviço aos jovens. É justamente por amá-los que devemos nos esforçar para apresentar o esplendor da Missa, a sua realidade sacrificial e mística. Quando, pelo contrário, deformamos a Liturgia, mesmo com a melhor das intenções, estamos mostrando a nossa pequenez e egoísmo, já que impedimos a juventude de conhecer a sobrenaturalidade da Missa. Ora, nós amamos Cristo e justamente por amá-Lo queremos que os jovens O conheçam. Mas como apresentar os jovens a Cristo se nós somos os primeiros a deformar o Seu Sacrifício e ainda alegando que isso é para o seu bem? Vejam a óbvia contradição!  A nossa fidelidade aos ensinamentos de Nosso Senhor deve nos motivar, justamente, a anunciá-los por todos os cantos, sem modificações, sem opiniões pessoais, sem desonestidade – do contrário estaremos prestando um desserviço a Cristo e aos jovens, impedindo-os de experimentar Jesus em toda a Sua grandeza.
O Santo Padre nos esclarece essa questão quando da Jornada Mundial da Juventude. As Missas da JMJ em nada se aproximam da algazarra litúrgica tão comum nos dias de hoje. As celebrações se encontram submersas na mais sublime mística e sobrenaturalidade. Vale lembrar que estamos falando de um dos maiores eventos da Cristandade e que tem como público os jovens de todos os cantos do mundo. Se as tais “Missas jovens” gozassem de licitude seria a Jornada o momento adequado para a prática dessa mentalidade litúrgica, entretanto, o que presenciamos é justamente o contrário; sobriedade, sacralidade e solenidade.
Além de tudo isso, os defensores de tais celebrações alegam que os jovens não gostam de Missas bem celebradas. Primeiro que, com a atual realidade religiosa, eu realmente duvido que todos os garotos desse país tenham tido acesso a Celebrações decorosas. Em segundo lugar, nada, absolutamente nada, justifica a deformação do correto espírito litúrgico. Quer dizer que as preferências e gostos dos jovens estão acima da digna reverência ao mistério do altar? Então os desejos da juventude devem ser cumpridos imediatamente em detrimento não apenas do ensino da Igreja como da reverência ao Sacrifício? Que inversão total e completa! Entretanto, faço questão de frisar que é realmente difícil saber se os jovens de fato apreciam tais celebrações. Começa que não poucas são as Congregações que definham porque não conseguem renovar as suas fileiras e muitas delas são, justamente, as que insistem na defesa das “Missas jovens”. Será que não percebem que a difusão dessa espiritualidade relaxada, que eles consideram “jovem”, talvez seja o motivo da crítica situação em que vivem? Lançando mão de um jargão popular: é dar murro em ponta de faca. Chega a ser caricato, mas acima de tudo, triste, perceber que Ordens belíssimas murcham por dentro por falta de renovação e que, mui provavelmente, o motivo desse retrocesso seja a insistência numa mentalidade que pouco acende nos jovens o fervor religioso e o espírito devocional.
A Conferência Nacional de Vocações, nos EUA, encomendou uma pesquisa e descobriu que, atualmente, a esmagadora maioria dos vocacionados rumam para Congregações onde há piedade, fidelidade ao Magistério, uso do hábito, oração e vida comunitária. Além de sinalizar que os jovens chamados por Deus buscam a Tradição, a pesquisa mostrou que as ordens religiosas que se distanciam do carisma, rejeitam a própria história, adotam teologias imprecisas e tratam com descaso os ensinamentos da Igreja, estão atraindo cada vez menos vocações. Assim disse Irmã Maria Bendyna, diretora executivo do Centro para Pesquisa Aplicada no Apostolado da Universidade de Georgetown: “Eles [os jovens] são mais atraídos por um tradicional estilo de vida religiosa, onde há vida comunitária, oração comum, com Missas conventuais, Liturgia das Horas. Além disso, a fidelidade à Igreja seria importante para eles. Eles buscam comunidades inequívocas, cujos membros vestem hábito”. Entretanto, mesmo aqueles que não são verdadeiramente vocacionados, que se aproximam das Congregações apenas tocados pela beleza e pela piedade que exalam, são belíssimos exemplos de como o uso dos hábitos, os cantos, as Missas decorosas, santificam as almas, causam um bem tão sublime que faz com que jovens confundam devoção com vocação. Apenas nas mentes tresloucadas dos religiosos adeptos de teologias estranhas que tudo isso não passa de ornamentos desnecessários que atrapalham a fé do povo. A prova inconteste do erro de tais conclusões é que crescem as dioceses e congregações que primam pela ortodoxia e sacralidade e definham aquelas que ostentam orgulhosas a bandeira do modernismo mesmo quando o barco já se encontra quase naufragado em meio ao oceano.
Então do que estamos falando, em concreto? De religiosos que realmente têm um sincero foco pastoral ou de religiosos que apenas tentam justificar a própria soberba teológica com argumentos pífios? Ora, se, de fato, houvesse esse sincero desejo de aproximar a fé dos jovens, de propiciar um ambiente religioso sadio que favorecesse o desenvolvimento de vocações,  seria muito mais natural e lógico defender estratégias constatadamente eficientes que, não por acaso,  sempre estão alicerçadas sobre os ensinamentos da Igreja. Entretanto, o posicionamento dos relativistas peca, justamente, nesse ponto. A banalização do sagrado, o combate ao espírito de piedade e devoção, apenas afastou os jovens do chamado religioso, tanto é assim que as Congregações, Ordens e Dioceses que comungam de tais absurdos vivem verdadeiras crises por falta de renovação. Do outro lado da moeda, os religiosos que buscam a fidelidade ao Magistério, que primam pela ortodoxia e contrição, conseguem conquistar muitos jovens católicos que, mesmo quando não têm vocação, são tocados pela forte reverência, humildade e sinceridade da fé. Em suma, a dita modernidade tão aclamada e usada para justificar todo o tipo de erro e desobediência, não passa, nesse caso, do herético e condenado modernismo, onde, a sua insistência por tais religiosos, é menos pelos jovens e mais pelo radicalismo que têm na defesa daquilo que consideram sensato e correto, mesmo quando se opõe aos ensinamentos da Igreja que eles dizem seguir.
Nesse ponto gostaria de fazer uma reflexão mais aprofundada a respeito do hábito eclesiástico, já que, querendo ou não, se encontra intimamente ligado à renovação vocacional, e vamos saber o motivo.
Muitas vezes os defensores da abolição do hábito eclesiástico argumentam dizendo que o importante, de fato, é o interior, a essência. Entretanto, essa falsa dialética entre o corpo e a  alma, exterior e interior, é estranha aos mais básicos ensinamentos cristãos; ao contrário, se assemelha às concepções heréticas tão comuns na Idade Média; cátaros, albigenses, gnósticos de todos os tipos etc. Negar a superioridade da alma é um erro que atinge pontos cruciais do cristianismo, assim como outra falácia de proporções grandiosas é menosprezar o corpo e o fato de constituir, juntamente com a alma, uma única substância. Exemplificando, a alma é o cavaleiro e o corpo é o cavalo; o cavaleiro sem seu cavalo é derrotado e o cavalo sem o cavaleiro é descontrolado. Dr. Plínio Corrêa de Oliveira esclarece a questão: “Está na ordem natural das coisas que o homem espelhe sua alma na fisionomia, na voz, na atitude, nos movimentos. E como o traje deve revestir o corpo humano, é natural que o homem se sirva também dele como elemento de expressão. Tanto mais quanto o traje a isto se presta eximiamente (…) a necessidade de expressão da alma é uma conseqüência imperiosa do instinto de sociabilidade. De onde, recusar ao homem esta possibilidade é, em si, falsear o próprio modo de ser da alma (…) os costumes sociais consagraram em todos os tempos e lugares certos trajes como característicos de profissões ou estado de vida, que exijam uma conformação de alma muito peculiar. E sempre se entendeu, com razão, que o traje profissional auxilia o homem a realizar inteiramente sua mentalidade. De um militar que tivesse antipatia à farda, de um juiz que tivesse ódio à toga, nada se auguraria de bom. (…) Dizer-se, pois, que o hábito não faz o monge, ou a farda não faz o herói, é e não é verdade. Com efeito, o homem não se torna monge, ou militar, autêntico só por adotar o traje próprio a tal estado. Mas o hábito monástico facilita ao homem de boa vontade tornar-se bom monge. E o mesmo se pode dizer da farda.”
Isto posto, devemos partir para a reflexão pretendida. O hábito eclesiástico, por ser um símbolo, tem um fim pedagógico. Claro que, infelizmente, muitos homens na atualidade vivem um verdadeiro analfabetismo simbólico, ou seja, incapacitados de reconhecer símbolos que refletem a riqueza e a genialidade do próprio ser humano. O Cristianismo, sem a menor dúvida, foi o maior promotor dessa via de evangelização; usou e abusou da beleza simbólica como ferramenta de catequização e conversão, já que a via pulchritudinis, juntamente com o simbolismo sacro, dialoga diretamente com a alma. A relevância simbólica do hábito é tão óbvia que até mesmo os adeptos da Teologia da Libertação, na década de 70, entendiam. Dentro dos conventos, mosteiros e paróquias o uso era proibido e visto como “reacionarismo”, entretanto, quando das passeatas, protestos e levantes os Sacerdotes, frades e monges faziam questão de ostentar suas batinas, hábitos dominicanos e vestes franciscanas. O hábito, como um sinal visível, engrandecia e destacava claramente as reivindicações feitas que, de certo, passariam desconhecidas se não houvesse um símbolo tão enfático da presença religiosa. A mesma realidade simbólica do hábito eclesiástico motivou o ódio dos comunistas na Europa Oriental. Quantos Sacerdotes, frades, freiras, monges, foram martirizados apenas por usar uma simples veste? O que, então, fundamentava a ira dos bolcheviques? Até mesmo os seguidores do marxismo genocida reconheciam que o hábito era um sinal claro da presença religiosa, justificando, assim, a violenta ojeriza. Durante as perseguições os homens e mulheres consagrados a Deus se recusavam a tirar seus hábitos por entender que seus efeitos e qualidades, como a constante recordação da consagração, combate aos efeitos da dessacralização social etc,  estavam além de um simples sentido indumentário; o hábito era o distintivo da presença dos soldados de Cristo!

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